28/05/09

CAT - Tercena

As semanas sucedem-se ao ritmo das experiências: à velocidade da Luz…
No CAT continuo a ter uma audiência reticente. Como crianças que são, gostam é de se sentirem livres. E eu bem as compreendo.
As crianças querem conhecer o mundo e para isso aprendem através das acções. A Alma quer conhecer como o corpo se comporta, fazendo brilhar nos seus olhos toda a Sua Luz, Pureza e Entusiasmo. Como ainda a alma rege o corpo, as crianças têm imensa alegria e energia. Por isso é que o nosso coração se derrete com os seus sorrisos, tão sinceros, tão puros. E também nos fazem lembrar que esta mesma criança ainda vive dentro de nós, ansiando por poder manifestar-se. E que nós repetidamente sufocamos, desculpando-nos com os padrões sociais.
Se realmente nós quisermos, continuamos a ter acesso a este manancial inesgotável de energia durante toda a vida. Mas encobrimos a nossa Luz colocando máscaras e mais máscaras, até que perdemos a noção de quem realmente Somos.
Mas voltando a quem ainda tem idade de criança: como disse anteriormente tive de ajustar a actividade às crianças.
Já tentei várias abordagens, já contei histórias, levo sempre mantras diferentes, já levei divindades indianas, com música, sem música, etc. O resultado é muito semelhante: uma certa apatia e relutância em fazer a actividade.
Na semana passada senti que a minha colaboração esteve em perigo. Depois de andar a chamá-los pessoalmente e eles inventarem desculpas para não assistir, lá foram.
Nada participativos e interessados, mas nunca mal-educados. Expressões fechadas, pouco dinamismo mas nunca me faltaram ao respeito com palavras.
Transmiti a situação ao João Monjardino. Sempre diligente no sentido de arranjar uma situação confortável para todos, combinámos tentar mais uma semana. Ele iria tentar sensibilizar as crianças para serem mais pró-activas.
Nesta 3ª lá fui com alguma apreensão, mas disposto a dar o melhor. Eles trocaram duas das crianças. As novas são mais interessadas. Mas continuou uma certa apatia.
No fim, voltei a falar com o João e quando me perguntou se iria continuar, senti como que um abanão interior. Algo muito forte me fez dizer que SIM! Não fui capaz de ”voltar as costas” a estas crianças, a abandoná-las. Olhando para trás, houve pessoas que me apoiaram mesmo quando eu não estava a ser correcto e por tal, ainda as guardo preciosamente no meu coração e me sinto grato pelo apoio incondicional delas.
À semelhança de outras ocasiões, no CAT senti que tinha de continuar não por elas gostarem ou não, mas pelo serviço que eu podia proporcionar.
O quanto eu gostaria de ter tido alguém que me mostrasse realmente a espiritualidade quando eu era muito jovem. Possivelmente não estaria agora a desconstruir tantos preconceitos e maus hábitos e ainda à procura de mim próprio.
Decidi que era muito mais importante transmitir sabedoria universal (mesmo que eles finjam que não ouvem) do que ser mais um na sociedade a deixá-los “para trás”. Acho que isto eles já tiveram o suficiente na vida, se sei um pouco (muito pouco) mais, então tenho de tomar as decisões mais acertadas e assegurar que estes jovens tenham mais uma possibilidade de serem realmente Felizes!Saí com o coração a transbordar de Felicidade. É bom sentir que estamos a servir bem o Universo.

25/05/09

I Meia Maratona na Areia

Ter a experiência de estar nos bastidores de uma prova foi muito enriquecedora.
A Associação o Mundo da Corrida organizou a 1ª Meia Maratona na Areia e eu foi colaborar. Fiquei ainda mais orgulhoso de ser sócio desta mui nobre associação.
A prova teve início na Praia Nova da Costa da Caparica tendo sido o retorno feito a meio da distância.
O Eduardo e a Margarida foram irrepreensíveis no seu enorme empenho nesta iniciativa pioneira. Em geral, todos os sócios (e amigos) se uniram para proporcionar uma prova agradável e o mais gratificante possível. Podendo estar a puxar a brasa ao meu pimento (sou vegetariano!), acho que conseguimos!
Sinto que não estou a vangloriar em vão. Todo o feedback que ouvi foi muito positivo. Claro que existem sempre alguns elementos que se centram em pormenores para tentar ofuscar o grande resultado deste evento.
Um dos reparos construtivos foi para o lixo originado pelos abastecimentos. Situação que foi registada para os futuros eventos mas foi de imediato sanada. Toda a extensão do percurso foi posteriormente limpa por nós.
Ao mesmo tempo, gostei. Denota uma maior consciência ambiental. Socialmente há um maior dever de proteger o lugar maravilhoso que habitamos. A evolução é lenta mas firme.
Nunca sequer imaginei a complexidade que é a organização de um evento destas dimensões! Tivemos cerca de 550 participantes nas duas provas!
Há inúmeros detalhes que só se percebem que existem quando estamos a preparar a prova. Todos colaborámos ao máximo para que nada fosse descurado. Que nada pusesse em risco o conforto do atleta/caminheiro e a beleza da prova.
Eu fiquei no abastecimento dos 15 quilómetros em que tínhamos fruta e água.
A estrutura foi modificada várias vezes para facilitar ao máximo a passagem dos atletas. Em piso sólido, transportar qualquer coisa é relativamente fácil mas para movimentar mesas cheias de garrafas de água praia fora garanto-vos que é preciso grande equilíbrio e força. Esta dificuldade acrescida tornou todas as tarefas muito mais pesadas (no sentido directo!). A areia mole dificulta qualquer tarefa, inclusive a de correr.
A minha experiência como atleta de pelotão foi muito importante na minha prestação de abastecimentos aos atletas.
Tentei dar uma palavra de apoio a todos. Eu sei o quão inspirador é um incentivo numa fase da prova em que o esforço já é muito. Adaptei (à semelhança dos outros colaboradores) a táctica espanhola do “Ânimo! Ânimo!” (muito conhecida e apreciada pelos participantes de Ronda, e não só.) e tentei não só reabastecer o corpo como o espírito. Foi ainda mais gratificante cumprimentar e incentivar os amigos de outras provas!
Mais uma vez uma palavra de apreço a todos os atletas, caminheiros, staff e em especial ao Eduardo e à Margarida . São organizações como esta que fazem sentir orgulho de correr.
No fim, ficou o sentir da missão cumprida. Foi com imensa alegria interior que sai da Costa.

Meditação na ALBA

Na passada 6ª tive mais um grande momento dourado.
Estive na companhia de grandes almas que, ainda por cima, se manifestam no corpo de amigos. O grande e habitual Vítor (corpo de estatura média mas uma alma muito grande), a Mareen (sempre simpática e alegre. Condiz com a sua grande sabedoria) e a Fernandina (sempre amiga e profunda).
A sessão foi muito intensa. Esta intensidade manifestou-se exteriormente na entoação de mantras. Parecia que as nossas vozes uníssonas provinham de uma só alma. E como é possível serem ao mesmo tempo tão fortes e tão doces!
Senti muita Alegria e uma expansão do meu Ser como há muito já não sentia.
E só podia terminar a entoar Gratidão pois era essa a alegria que jorrava do meu coração.Mais uma vez: Gratidão por Existirem!

Terapias do Amor e da Alegria

Desde o primeiro contacto senti uma ligação muito especial à Virgínia de Sá e ao espaço Terapias do Amor e da Alegria.
Com a colaboração directa da Virgínia de Sá tenho partilhado sessões de meditação às 3ªs e 5ªs às 13h30m.
O grupo formado ainda é pequeno mas com tendência de expansão. As sessões têm sido sublimes. Existe um Néctar em torno de cada um de nós que brota directamente da alma. Cada sessão oferece pérolas de Bem-Aventurança.
Saímos das sessões com o contentamento de quem experienciou algo bem profundo e elevado.
Sinto imensa gratidão por esta oportunidade Divina.
Também me foi concedida a oportunidade de dar massagem Ayurvédica. Foi com muita alegria interior que as fiz. Espero que tenham desfrutado.
Sinto uma certa vontade de que chegue a hora da sessão de amanhã, pois sei que vai acontecer mais uma aventura interior permeada de Amor e Alegria.
Um grande Bem-Haja!

20/05/09

Os 101Km da Legião - III

Já era noite cerrada quando cheguei à nova paragem e, novamente, não havia nada para comer que fosse vegetariano! Foi um fim-de-semana a pão e iogurte… Os espanhóis ainda estão um pouco atrasados nesta questão. Em Lisboa já é aceitável ser vegetariano, e soube pelos outros participantes com o mesmo tipo de alimentação (de Viseu e Portalegre) que já começa a deixar de ser anormal ser vegetariano.
É bom sinal saber que em Portugal começa a haver uma certa abertura (importantíssima nesta altura do nossa evolução) para novas formas de Estar e de Ser.
Arranquei com um grupo que foi flexível mas todos sempre estivemos próximos até ao final. A mente aqui foi crucial. O corpo já não obedecia. Ora ia em piloto automático, como se recusava a mexer. Os quilómetros esticavam, o cansaço imperava, todos os montes iluminados pareciam Ronda. Houve alturas em que eu acho que íamos a pensar: vamos todos chegar ao fim, mas onde é que é esse final?
Eu já estava quase a desesperar quando ia a meio de uma subida super íngreme, com um empedrado que me fazia sentir ainda mais todas as zonas doridas, com um cansaço himalaico e a mente só dizia: “Ainda falta aquela última subida até Ronda.” O “complicómetro” disparou e tive de transcender a mente para não parar e descansar. E as espirais de pensamentos não paravam! E preocupei-me, chateei-me, tive um turbilhão de ideias, morri, nasci até que no final da subida a Célia disse com felicidade na voz: “Já está! Agora são só umas ruazitas e é logo ali a meta!”
E então percebi o que se tinha passado: mais uma vez estava preocupado com uma situação que apenas era real na minha mente. Não existia no presente e acabou por não existir de todo. Mesmo sabendo que o futuro é só o resultado do presente e que, de certa forma, não existe; mais uma vez deixei-me ir e perdi-me. Deixei a imaginação tomar conta do Presente e criar situações imaginárias, desequilibrando-me interiormente, fazendo-me sofrer sem motivo.
E ela tinha razão: foram só mais umas ruas e já lá estávamos. Os quatro cruzámos a meta de mãos dadas exaltando a fraternidade da Legíon.
Bato palmas a TODOS os que desafiaram “Ronda” (mesmo os que falharam desta vez). É uma prova muito dura mas torna-se muito bonita e conta com uma organização irrepreensível.
Na viagem de volta partilhámos aventuras, perspectivas mas acima de tudo, estávamos juntos depois de mais uma Grande (e muuuuuuito longa) incursão lusa em terras espanholas.
Valeu por tudo, aprendi muito e, sinceramente, se fosse fácil, quem é que iria?

Os 101Km da Legião - II

Como todas as Utras que tenho feito, também esta foi recheada de experiências. Umas muito agradáveis, outras com muito desconforto misturado.
Uma das caricatas aconteceu perto do abastecimento do quilómetro 28. Íamos palmilhando as ruas de uma vila cheia de pessoas simpáticas que estavam à porta com garrafões de água, algumas também com fruta e sempre, sempre com um gesto de encorajamento, quando reparo num rapaz sentado com ar de sofrimento enquanto agarrava os quadrícipedes e sinto um impulso para o encorajar. Lembrei-me que levava ligaduras comigo e avaliando a situação, achei que podia aliviar alguma dor ao meu parceiro de jornada. Falei com ele e, mesmo em plena prova, envolvi-lhe as zonas doridas. Ele agradeceu-me imenso e eu fiquei muito feliz por ter sido de bom préstimo.
Sentindo a energia a irromper de mim, abasteço-me e ataco a subida (e que subida! 5kms com grande inclinação) com entusiasmo, conseguindo manter um andar vigoroso. Mais subia, mais o meu coração se apertava ao ver vários companheiros quase desfalecidos, tal era a imponência da inclinação. Tentei dar a todos uma palavra, perguntar se tinham água, se precisavam de ajuda. Continuava a avançar a bom ritmo, mas ia triste. Muitos participantes acusavam o desgaste causado pelos quilómetros e pelo calor do pino do Sol, uns sentando-se outros deitando-se nas poucas sombras existentes, outros completamente prostrados. Não foi bonito de se ver. Senti bastante gratidão pois podia perfeitamente ser eu a estar nos seus lugares.
Todas as Ultras são imprevisíveis. Podemos ir muito bem, mas devido à longa distância das provas, algumas horas mais tarde podemos ficar exaustos e aí, tudo pode acontecer. Vários participantes portugueses tiveram problemas gástricos, eu inclusive (perto do quilómetro 77).
E devido à extensão das provas existem demasiadas variáveis (fisiológicas, climatéricas, equipamento, abastecimentos, etc., etc.), e qualquer uma pode passar a ser determinante e provocar o abandono.
Já ia quase no 40 quando comecei a acusar um grande cansaço aliado às dores musculares que me começavam a incomodar bastante. Fui sempre abastecendo o máximo para manter o corpo o mais estável possível, pois é sempre um grande desgaste a nível fisiológico. Ainda mais com o calor que se fazia sentir. Os quilómetros rolaram até que vejo que estou a entrar em Setencil, onde seria a primeira grande paragem.
Setencil é muito bonita. Aqui, a arquitectura é muito orgânica, muita viva. O ponto alto para mim foi uma casa em que o telhado era a rocha em si, e esta ainda passava por cima da estrada e ainda cobria parte da casa em frente. Mesmo o pavimento e os restantes edifícios eram em tons e materiais que imitavam a natureza local.
Com ainda mais apoiantes (sempre incansáveis, estes espanhóis!) e a proximidade do repouso, o entusiasmo subiu e qual não é o meu espanto ao ver vários participantes a beber qualquer coisa numa esplanada, por sinal, muito tentadora. Em Setencil respirava-se uma tranquilidade muito sublime.
Neste abastecimento (55kms, com 8h de prova) troquei algum equipamento e como estive com alguns colegas, fiquei a saber que todos estavam a progredir (o Vítor recebia notícias dos outros participantes por sms), alguns com bastante ligeireza. Fiquei contente.
Ainda arranquei com um amigo de outras aventuras mas eu estava com mais dinamismo e passei novamente a palmilhar o caminho sem mais ninguém mas não sozinho (Inclusive, mais para a frente, senti de uma forma tão tangível que todos pertencíamos à Legíon).
Já caía a noite e a minha prestação ainda se iria alongar por mais umas horas. Por volta dos 65kms e numa das graaaandes descidas as dores e o cansaço já tomavam conta de mim, vivenciei mais uma lição. As dores nos joelhos eram muito fortes. Quando corria, doía; quando andava, doía e por um instante, desesperei. Na minha mente tudo girava em torno da questão: Se qualquer esforço a descer era doloroso (e não queria ir a rebolar) como é que conseguiria chegar ao fundo? Então decidi, já que de qualquer forma dói, então vou correr. Entre ais e uis lá ia descendo, até que decidi mudar um pouco a postura e, qual não é o meu espanto, quando consigo correr a descer sem ter dores! Claro que devia ter uma passada apalhaçada, mas isso não me interessava!
O entusiasmo voltou pela descoberta que fiz. Senti que parte da lição era: nada é impossível existe sempre uma forma e a outra seria que as dores (físicas ou mentais) existem para aprendermos mais rápida e profundamente. Eu só descobri a alternativa sublimando a dor, enfrentando-a, aceitando-a e vivendo-a. Durante algum tempo ainda corri sem parar, sempre apoiado pelos habitantes das casas por onde passávamos, mas o meu estômago não estava a gostar do que tinha e, mesmo depois de ter evitado várias vezes, aceitei que o tinha de esvaziar. Os participantes, sempre solícitos a apoiarem, ainda pararam mas perceberam que não era preocupante. Era apenas mais uma situação a vencer.

Os 101Km da Legião - I

Mais uma prova que desafiou todos os limites interiores e exteriores.
A minha participação teve um processo curioso.
Como esta prova já tem tradição em Espanha e tem um número limite de participantes nas várias categorias, as inscrições esgotam sempre (as de BTT esgotaram na mesma noite em que foram disponibilizadas). Eu deixei passar o dia e quando me fui inscrever, já tinham fechado as inscrições. Fiquei um pouco triste pois era minha intenção participar, mas aceitei tranquilamente o facto.
Durante os Caminhos de Santiago, qual não é o meu espanto ao ser-me disponibilizada uma inscrição (mais uma vez: obrigado).
A minha vontade férrea de enfrentar os desafios é que me fez aceitar a possibilidade de participar numa prova duríssima, enquanto participava noutra também muito exigente e onde senti grandes dificuldades. E mais uma vez, não iria treinar convenientemente (não consegui recuperar totalmente, muito menos treinar apropriadamente).
Mas senti que se me era dada esta bênção, quem era eu para dizer que não? Tinha de me entregar ao que sentia que devia ser experienciado.
Ainda pouco o Sol subia no horizonte na sexta-feira, quando o autocarro com os atletas e seus acompanhantes (Mais uma vez, um Grande Bem haja para eles) partiu em direcção a Ronda. Viveu-se um espírito bastante descontraído durante a viagem. Alguns a fazerem planos, estratégias, tácticas para esta prova, outros a descansarem, outros a partilharem experiências passadas, mas sempre como uma grande família. Devido à grande exigência destas provas, em Portugal ainda existem poucos participantes, acabando sempre por existir um clima íntimo. Quase todos nos conhecemos e/ou já corremos alguma prova em conjunto. Para mim, este espírito é uma grande ajuda nos momentos mais exigentes, em que mentalmente já não nos conseguimos motivar e uma palavra, um gesto, uma atenção de alguém familiar transforma a noite em dia, interiormente. Todos compreendemos as dores, as dificuldades uns dos outros e experienciamos uma comunhão muito sublime, pois também já as sentimos, já vivemos algo semelhante. Nem sempre são precisas palavras, basta um olhar.
Depois de uma viagem de meia dúzia de horas, chegámos à nossa nova casa. Na organização respirava-se o típico rigor militar. Do principio ao fim, e durante 24 horas!, a organização esteve sempre à altura das necessidades dos participantes (na ordem dos 5000, no total das provas), excepto o facto que não ter alimentação vegetariana! Éramos três vegetarianos na comitiva (cerca de 25 portugueses). Achei muito curioso.
Sentia uma certa tensão no ar, como aquele silêncio pesado antes de uma trovoada. Todos sorriam e estavam bem-dispostos mas havia uma sombra no olhar. Todos sabíamos que na Legião (existe um certo culto a este grupo militar) não se brinca e que as dificuldades iriam requerer uma certa capacidade de transcendência.
Em linha com o espírito militar, partimos às 11h! de Sábado para mais uma epopeia. Já sabíamos que o Sol iria aquecer-nos muito para além do desejável e que muitos (eu também) iríamos regressar já pela noite dentro. Foi-nos dada a possibilidade de nos transportarem um saco com os nossos pertences para os 53km e outro para os 77km (excepto ao Mimoso, cujos sacos desapareceram…). Eu coloquei equipamento para trocar (e mais quente para a noite), suplementos energéticos, ligaduras, luz frontal e mais uns gadgets.
A partida foi tranquila pois todos sabíamos que ainda tínhamos muitas experiências pela frente e que o dia se iria tornar muuuuuuuuuito longo.
Fui desfrutando das lindas paisagens circundantes e da própria arquitectura de Ronda, rolando ao ritmo dos encorajamentos dos milhares! de pessoas que estavam nas ruas.Os quilómetros sucederam-se e abastecimento após abastecimento, só podia enaltecer a prova em si. A organização esteve irrepreensível. O abastecimento, a sinalização, o staff e toda a estrutura de apoio esteve impecável, mesmo com a quantidade de participantes nas várias categorias, ao longo das 24! horas.

07/05/09

Caminhos de Santiago – IV

Faltando somente(!) 42 quilómetros para entrar na praça da Catedral todos os atletas/peregrinos se reuniram uma última vez ao raiar do Sol e saíram para a derradeira etapa que os separava da meta.
O Eduardo já com uma vantagem confortável sobre o 2º classificado arranca num ritmo impressionante (e pelo que sei manteve-o até ao final! Ah! Granda Eduardo!) enquanto eu, de joelhos ligados e de estômago às voltas mal conseguia caminhar, ficando logo para trás.
A má disposição, acho que teve a ver com o facto de já não estar habituado a tanta coisa energética como suplemento.
A questão das ligaduras foi a repetição da etapa anterior: firmes até ao final! (Mais uma vez, um Grande Bem haja à Emília). Tive de transcender a mente e deixar de pensar que ia correr uma maratona com a zona dos joelhos bastante dorida e frágil, e que para isso, em vez de descansar, ia para a estrada rumo a Santiago.
O mau estar geral imperou durante a 1ª hora, altura em que falei via telemóvel (!) com a Margarida que, mais uma vez, me motivou ajudando a manter firme a determinação de vencer os quilómetros finais.
À 4ª hora de prova (demorei 6h) pensava que ainda seguia muito atrasado, e qual não é o meu espanto ao ver o grupo das Lebres do Sado vindos de um trilho mais à direita! O cansaço vencia e nem consegui racionar. Depois é que percebi que me tinha enganado, à semelhança de outros.
Ainda esboço uma tentativa de perseguição mas em vão. A Força já não me acompanhava. Enquanto prossigo a caminhar, tento motivar-me a voltar a correr. Os meus passos já são de corrida, e alegro-me ainda mais quando vejo a poucos metros à minha frente o António. Tento alcançá-lo, mas os metros que nos separam esticam. Pouco a pouco junto-me a ele, mas nisto volta a mesma questão: não consigo correr nas descidas, nos quais ele aproveita a ajuda da gravidade, e lá vai ele. Nas rectas e nas subidas esforço-me por não ficar para trás. Entrar em Santiago lado a lado deu-nos mais motivação para darmos tudo. Sentindo que já lá estávamos, o entusiasmo cresceu. Entregámo-nos a Santiago e foi ele que nos levou numa nuvem tal era a sensação de leveza. Correndo por ali acima e percorrendo as ruas até à Praça, revivi sensações estonteantes. Não senti aqueles metros finais, voava. Transbordava Alegria, Felicidade, Gratidão, a sensação de ter cumprindo o que estava destinado. Rever companheiros na meta foi demais.
Depois de ter agradecido TODO o apoio a TODOS, dirigi-me para o merecido banho e repasto. Sentia-me ainda a flutuar e um pouco incrédulo.
Sinceramente, sei que não cheguei por mim próprio. O apoio de todos e do Universo fizeram tudo. Eu apenas manifestei. Fui mero instrumento.
Expiei toda a minha arrogância de ter ido para uma prova destas sem treinar. Mas mesmo assim, concluí-a. Pela 2ª vez, fui peregrino de Santiago e pela sua Graça, cheguei.
Emocionei-me (eu e quase todos) na cerimónia de entrega dos diplomas, pois o Moutinho transmite-nos todo o seu calor e o de Santiago. Grande Confrade!
O Eduardo foi estonteante: 12h43m53s!!! O 2º classificado demorou mais uma hora! E eu mais 8h30m! Uau!A pergunta que ficou: Quando é que se realiza a nova edição? Queremos mais!

Caminhos de Santiago – III

Quando o Sol despontou já nos estávamos a equipar, lançando-nos de novo ao Caminho.
Logo no arranque percebi que muito dificilmente iria chegar em condições ao almoço. As dores tornaram-se mais fortes a partir da 1ª hora de prova (e eu calculei que iria demorar 2h, mas acabei por fazer 2h30m) e faziam-se sentir ainda mais nas descidas. Onde se sentiam menos eram nas subidas. Foi um período que me obrigou a ser ainda mais determinado, pois mentalmente era frustrante. Os meus companheiros aproveitavam as descidas para esforçar menos os músculos e as minhas articulações obrigavam-me a caminhar. Nas subidas eles poupavam-se e eu tentava não ficar muito para trás. Aiaiai! Algo estava distorcido…
Percebi que se amparasse a articulação do joelho a dor era bem menor mas não tinha nada para fazer ligadura até que me lembrei da minha T-shirt de manga comprida e agucei o engenho: dei um nó em cada manga para suster cada joelho e lá fui eu.
As expressões de quem me viu chegar eram de incredulidade: nunca tinham visto semelhante aparato que tinha uma forma completamente bizarra (existem fotosJ).
Ainda pensei em desistir mas a minha Voz Interior (ou Santiago) fez-me sentir que tinha de continuar, tinha de vencer o desafio físico e mental.
A Emília (muito mais do que uma massagista, uma grande e integral terapeuta) ainda me tentou demover mas viu em mim a determinação de chegar a Santiago, mas não tinha ligaduras (nem eu, nem a organização). Quero agradecer ao Vítor Mota ter-me dado uma ligadura. Foi este generoso gesto o grande responsável pela conclusão desta epopeia.
Depois dos 18 quilómetros da manhã lançámo-nos à estrada mais uma vez, sendo o pelotão controlado pelo Moutinho até à saída das ruas da vila.
Os transeuntes apesar de já estarem habituados a peregrinos ficaram estupefactos ao verem passar semelhante grupo: mais de 40 pessoas a correr para Santiago e um cão.
Este cão foi logo baptizado de Santiago (o cão tinha uma Paz muito especial) e acompanhou as três etapas, percorrendo mais de 70 quilómetros sem exigências ou clamores. Agradavelmente corria ele ao lado dos atletas! Algo extraordinário a meu ver.
Mal o pelotão pode ter o seu ritmo próprio, os diferentes ritmos fizeram-se sentir ficando eu, completamente para trás. Não me preocupei, sabia que tinha de gerir muito bem as minhas capacidades para triunfar sobre as minhas limitações.
Não estava muito calor, mas pontualmente por entre trilhos cheios de água e de verde, vinha uma brisa escaldante. O meu grande companheiro de percurso (António Pousada) ajudou-me a tornar os quilómetros menos penosos.Se bem que, devido à minha inexplicável capacidade de regeneração, no fim da etapa fisicamente estava bem indo as maleitas afrouxando a sua manifestação. Sem dores e ainda com alguma energia foi como cheguei ao jardim onde estava a meta desta etapa.

Caminhos de Santiago – II

Preparado todo o material a levar (é uma prova em auto-subsistência. Cada atleta/peregrino transporta consigo o que vai precisar. Seja líquidos, isotónicos, gel energético, barras energéticas, outros suplementos e diversos gadgets. Os preferidos são o telemóvel (cada vez mais presente… e eu usei-o…) e a máquina fotográfica. Lá fomos abençoados pelo Confrade Moutinho (o impulsionador da prova) e arrancámos de Vila Praia de Âncora como um grupo de Peregrinos mas à século XXI: com pressa :)
O ambiente que se respira nestas provas é diferente. Existe uma competição saudável. Todos querem dar o melhor mas existe uma atitude de companheirismo e de entreajuda. Dar o seu melhor, o máximo, algumas vezes usando o “vencer o outro” como motivação mas não como fim. O vencedor deste ano, Eduardo Santos, é o perfeito exemplo: quer ficar em primeiro mas à custa do seu empenho tanto nas provas, como fora delas.
Logo nos primeiros metros se entendeu as diferentes capacidades e intenções. Os diferentes grupos formaram-se consoante o andamento imposto mas acho que no interior de todos o sentir era o mesmo: peregrinar até Santiago.
Sentindo logo nos primeiros quilómetros a minha falta de preparação acompanhei o grupo da retaguarda. Este grupo permeado de habitueés bem-dispostos foi crescendo de etapa a etapa (porque é que será?).
A magnífica paisagem fez-nos sentir todos mais leves a cada quilómetro. Depois de algumas setas perdidas (o percurso em Portugal é indicado por setas amarelas e em Espanha por vieiras (um tipo de concha) já se aproximava o Quartel do Bombeiros que seria o nosso oásis no intervalo das etapas.
Os Comezainas voltaram a brindar-nos com as suas apetitosas refeições e com a sua simpatia. Eu agradeço o facto de sempre terem algo vegetariano para mim.
Depois do intervalo voltámos à peregrinação. Os 40 quilómetros da etapa da manhã mostraram-me que Santiago ainda ficava muuuuito longe para mim. Mesmo com o incansável apoio da Margarida, da organização e dos meus companheiros iria ser muito complicado.
Todos estavam apreensivos com o calor que se manifestava mais intenso pois a recta da Zona Industrial costuma ser um deserto. O calor que se fazia sentir aliado ao facto de termos saído de uma zona em o caminho se faz por entre as copas das árvores e passarmos para uma zona onde o alcatrão impera (e o calor que o alcatrão liberta!!!), faz desta zona um dos pontos de maior transcendência do percurso.
Santiago estava (e sempre esteve) connosco e para nós: soprava uma suave brisa que nos refrescava o rosto e a alma fazendo parecer a vila de Redondela mais próxima. Retomando à zona verde com algumas incursões na estrada principal, entrámos no centro e percorremos a distância que nos separava da Escola onde pernoitaríamos em comunidade.
Alegro-me sempre que a meta se aproxima. É como uma sensação de missão cumprida. Mal ou bem cumprida, quem sou eu para julgar? Esforcei-me e dei o meu melhor. Para mim é o mais importante.
Cheguei já bastante debilitado mas decidido a cumprir pela segunda vez esta prova mística.
O banho, o alimento e a companhia tornaram as últimas horas uma recordação agradável.
Tempo só para comentar o que aconteceu e o que estava para vir antes do repouso merecido.

06/05/09

Caminho de Santiago - I

Um dos desafios pelo qual tenho particular gosto é o ultra-maratonismo.
Percorrer distâncias longas, superiores à da maratona (42,195Km) é sempre algo transcendente. O nosso corpo está preparado fisiologicamente, mas a mente não.
Habituámo-nos a quantificar tudo. Até as nossas capacidades. Acreditamos piamente que só conseguimos um tanto de desempenho em determinada tarefa. E quando fazemos uma tarefa que vai muito para além do exigido habitualmente? Como é que tudo passa a acontecer? Como é que nos vemos e como vemos tudo?
Estas são algumas das premissas a que me proponho quando faço uma prova de ultra-maratona. E quando é uma com um cenário místico, então aí, questões muito profundas afloram durante todas aquelas horas a percorrer aquele não mais acabar de kilómetros.
Este fim-de-semana comprido, participei na prova “Caminho de Santiago Trail Aventura 2009” organizada pela Confraria Trotamontes. A prova ligou Vila Praia de Âncora a Santiago de Compostela, na distância de 160km divididos em 5 etapas.
Também participei na edição de 2008, que partia de Ponte de Lima percorrendo 155km até Santiago.
Mais concentrado nas minhas actividades de Meditação e Yoga, e com as peripécias de mudar de casa fiquei sem entusiasmo para treinar, mesmo tendo descoberto um trilho fantástico em plena Lisboa! Parte da zona da Alameda (do Técnico) e vai até ao Parque da Bela Vista. Mais uma faceta desta cidade sempre surpreendente.
Depois de várias peripécias na tentativa de arranjar boleia para a prova, eis que surge uma notícia muito agradável: tenho lugar no carro do Eduardo e da Margarida.
São um exemplo do que é servir a comunidade. Sempre dinâmicos, firmes, simpáticos. Gostei muito de ter feito as longas (longas mesmo) com eles. “Encurtou” a distância e proporcionou Bem-Estar.
Agora, por morar e ter as minhas actividades em Lisboa, o meu transporte de eleição é a bicicleta. É económico, saudável, não polui, é fácil de estacionar, e acaba por ser rápido. Demoro em média, 20 minutos em qualquer trajecto no centro de Lisboa. Claro que cada viagem é uma aventura. Lisboa ainda não acolhe as bicicletas como deveria. Sem dúvida que Lisboa é um constante carrossel, ora sobe, ora desce; mas faz-se um bom exercício cardiovascular.
Mas só esta actividade física (além do Yoga) não prepara adequadamente para uma prova como os Caminhos de Santiago. Em geral, mesmo os participantes que treinam regularmente (e outros que têm valor em distâncias curtas) têm de se empenhar totalmente para concluir a prova. E eu que fui para Santiago sem treinos…
Estava bastante apreensivo com a minha prestação. O resultado confirmou a minha ideia mas ao mesmo tempo, superou-a.
Tive dificuldades como nunca, mas também fui determinado como nunca. Só posso dizer que me transcendi integralmente. Tanto psicologicamente (em que consegui superar todos os desafios) como fisicamente (a roçar o masoquismo).

CAT

Quando a imagem do CAT aflora, uma palavra surge: Fantástica!Têm sido sessões plenas de experiências intensas e bastante exigentes!
Cada sessão é única! Tudo acontece exterior e interiormente a um ritmo incrível.
Sinto uma transformação mútua. Tanto neles (mesmo que a tentem encobrir), como em mim. Devagar mas de uma forma contínua, todos os corações naquela sala se abrem mais e mais. A minha percepção dos mais novos têm-se transmutado e isso revela-se no exterior pela minha melhor relação com eles. Nem consigo descrever exactamente o que mudou, mas sinto dentro de mim que algo desabrocha. Como que um Amor com um “A” maior, mais Universal.
Sinto da parte deles uma maior tolerância em participar, e gradualmente, participam nas actividades com uma atitude mais proactiva e, acima de tudo, mais sinceros.
Tento transmitir uma mensagem de Paz, Fraternidade e incentivo-os a olharem mais para dentro, buscar o seu Eu Verdadeiro.
No inicio, as sessões eram inteiramente de Yoga do Riso mas senti que eles não entendem o que são as nossas preocupações. Abençoados! Tentei adaptar as situações habitualmente usadas como motores do riso à realidade deles mas também o interesse não aumentou. Introduzi asanas e um espaço para diálogo e eles revelaram um maior interesse.
Mas continuam irrequietos! Nas minhas sessões costumo encontrar um público adulto (às vezes simples crianças grandes, agora o vejo) com outra forma de serem cativados. E as crianças mantêm um potencial ilimitado de energia. Precisam de expressar essa torrente de energia de alguma forma. Correm dentro do ginásio, implicam (na brincadeira) uns com os outros, não conseguem ficar muito tempo na mesma posição, tudo é motivo para iniciar uma nova brincadeira, alegria sempre pronta a aflorar. Tudo isto é puramente normal para as suas idades (uma média de 9 anos). Eu simplesmente já não tinha recordação deste puro existir. Sinto a minha criança a renascer como uma Fénix das cinzas. Não para voltar ao passado mas como que trazendo uma nova consciência.
Agora, já na 5ª sessão, continuo a perceber nos seus rostos que não é a actividade que eles mais gostam de fazer mas sinto que, ao seu jeito, atingem o significado das sessões.
Um grande Bem-Haja e até 3ª feira!